O tema de hoje é sugestão de um CFO de uma grande empresa fluminense: os efeitos da paternidade ou maternidade em nossa carreira
e produtividade.
Uma recente pesquisa da Universidade da Califórnia (mais detalhes:
http://www.economist.com/node/21555543) comprova que nos
tornamos profissionais melhores depois de virarmos pais. Teoria que apoio e acredito há muito tempo, pelas razões a seguir.
Antes de mais nada, quando ainda somos nós por nós mesmos, a carreira vem sempre em primeiro lugar. Queremos crescer, trabalhar até mais tarde não importa com que frequência. Sacrificamos nossa vida pessoal e momentos de lazer em nome da ascensão profissional, do status, poder e $$ que são sinônimos do aspiracional da grande maioria dos executivos workaholics.
Nem vou entrar no mérito das relações amorosas, de namoro, casamento, de morar junto, de vida a dois. Vou direto para o nascimento de um filho, planejado ou não, desejado ou não. Ter um filho é gerar uma profunda mudança em nossas atitudes em relação ao trabalho, sejam elas conscientes ou não.
Quando olhamos para um filho, a ambição da carreira passa a ter outras cores. A vontade de vencer vira vontade de prover. A importância de ser o melhor entre os pares vira pó ao percebermos o que é ser importante para uma criança que nos espera em casa. A luta por dinheiro e poder se transforma em gana de construir um patrimônio, de não deixar faltar nada, de proteger.
Depois de ter um filho, as horas de trabalho até mais tarde viram uma obrigação, uma angústia interna, pois não queremos perder o horário do banho, o cheirinho de sabonete, a cafungada no cangote, o abraço na alma, o momento abençoado da leitura de uma história, o adormecer em nossos braços como se o mundo parasse e não houvesse nada mais importante. Momentos que colocam os assuntos do escritório na sua devida importância, na dimensão real das prioridades na vida. Chegar em casa depois que um filho dormiu é conviver com o atestado de ausência, de opção racional, de violência emocional. Um filho nos coloca um freio nos abusos excessivos do trabalho, uma pausa para reconexão e perspectiva espiritual, nem que seja por algumas horas. Quantas vezes você, pai ou mãe, não saiu do trabalho antes do que deveria para poder ir para casa, dar banho, jantar e colocar seu filho para dormir, para então voltar para o computador e ficar trabalhando até tarde da noite? Ordem de prioridade de um pai ou mãe: em primeiro lugar, o filho, em segundo, o trabalho, em terceiro, você e seu sono.
E o peso na consciência se deixamos de estar com as crianças nos momentos especiais? Uma festa na escola, uma apresentação infantil ou uma mostra de trabalhos? Quem é pai sabe o que é se sentir a pior pessoa do mundo (mesmo sendo o profissional mais competente) por desapontar um filho, por faltar a um momento especial. Mil vezes um olhar de desaprovação de um cliente, uma bronca de um chefe ou um projeto refeito na totalidade do que o olhar magoado de um filho, a dor de uma pergunta não feita sobre o porque de nossa escolha pender (de novo) para o trabalho.
Outro aspecto diz respeito às prioridades e produtividade. Um pai ou uma mãe aprendem a ser mais produtivos no trabalho, a dar conta do que é preciso, a não perder tempo no café do corredor, a administrar seu tempo para poder estar em casa na hora certa. A análise do plano de lançamento do novo produto entra sempre na sequência do estudo da prova de matemática. Acompanhar a lição de ciências é mais importante do que o e-mail que recebemos do chefe. A pesquisa na internet sobre o trabalho de escola que vai ser apresentado no meio da semana tem prioridade absoluta sobre o contrato de M&A que deve ser entregue no dia seguinte. E assim por diante…
Ser pai é desenvolver uma lente emocional para a vida e também para o trabalho. É entrar num avião lotado de executivos, ter uma apresentação para revisar e não se irritar com o choro de um bebê de colo na poltrona ao lado, mas se compadecer com a cólica que deve estar causando o tal choro. É assistir a um belo comercial feito pela área de marketing e se engasgar com uma cena de pai e filho, quando antes somente se notava a qualidade das imagens e forma da mensagem. É passar na loja do aeroporto antes de voltar para casa e comprar uma bugiganga qualquer, só para ver a carinha deles ao tirarmos da mala um pequeno presente no nosso retorno.
Ser pai, ser mãe é se tornar um profissional melhor. Mais produtivo, mais inteligente emocionalmente, mais consciente do que é relevante na vida. É sair de uma grande apresentação para investidores, chegar em casa, tirar a gravata, sentar no chão e brincar de super herói ou Barbie. É mudar o canal cerebral e pular do Power Point para o Power Ranger, do Excel para o Lego, do banco de dados para o pé de feijão que cresce num copo de plástico. Ser pai é querer construir mais do que um patrimônio. É a vontade de criar um legado, um exemplo para nossos filhos. Exemplo que nos faz querer ser melhores, inclusive no trabalho. Mais éticos, mais atuantes, mais responsáveis, mais plenos. É repensar nossos hábitos e excessos no trabalho, e seu custo para nossa vida, nosso tempo e nossa saúde. É morrer de medo de não estar mais aqui para vê-los crescer e amadurecer. É querer ter uma vida mais regrada e saudável, somente para poder ter mais tempo. Não para o trabalho, não para a carreira.
Tempo para eles.
FONTE: Exame Abril